Saudade infante

Lembro-me que quando tinha lá meus doze anos, calçando uma alpercata tipo sandália japonesa, calçãozinho surrado pelas brincadeiras de criança, andando à cavalo, montando jumento saltador poupeiro, eu era uma criança feliz num mundo sem fronteiras para mim, num tempo  de jogar bola,  jogar castanha, trocar figurinhas, rodar pião, soltar pipa,  pescar de anzol, caçar passarinho de baladeira, nadar no rio do peixe, correr atrás de passarinho pelas roças e matos no trajeto  da Fazenda Jangada aos limites da ilha onde hoje é o Vale dos Dinossauros,  ou então nas terras de João Raimundo onde hoje é o Conjunto André Gadelha em um local denominado açudinho e que nos dias de hoje se transformou num esgoto a céu aberto, em razão das construções irregulares que canaliza o esgoto das casas do André Gadelha para o interior da lagoa. Era um mundo lúdico, onde todos conheciam todos aqui na região.
Havia um sítio que nós chamávamos de "velho Azarias" e nele havia uma beneficiadora de arroz, onde tomávamos banho de rio o ano inteiro!  havia muitos pés de manga por lá e era uma delícia surrupiar as mangas do "velho Azarias" e correr da ira dos empregados do sítio sob tiros de Sal, na tentativa de nos meter medo e nos castigar por aquela infração de roubar mangas e goiabas de seu pomar; mas, o bom era o roubado como um beijo da mais desejada menina; o bom era o proibido, era tomar banho nas águas do rio nos limites do "Velho Azarias" sendo perseguido sempre por seus empregados (numa dessas vezes prendendo nossos calções no interior da beneficiadora de arroz, e como resultado, ficamos nós, mais de oito meninos nus, pedindo num choro desesperado que nos devolvessem a roupa!).
Hoje sinto saudade desse tempo, dessa memória viva dentro de mim e que me fez o homem que sou hoje. Foi pela mão do tempo que me proporcionou uma infância completa, cheia de brincadeiras, aventuras entre a velha usina de Docil Braga até a jangada, passando pela ponte do trem, o sítio Paquequé e a barragem de Mestre Júlio Sarmento na lagoa dos patos.
Houve um tempo, que andei tanto no caminho de Sousa até o Sítio Jangada montado num cavalo branco que meu pai possuía e que me fazia todos os dias deixá-lo e ir buscá-lo na Jangada para fazer suas viagens pelos sertões (meu pai era boiadeiro e comprador de gado) que eu já sabia de cor o caminho, cada pedrinha que tinha no caminho, cada aclive, declive, a vegetação, os calangos que passavam na minha frente, cobras corre-campo, cobra verde, cobra de caçote, pássaros de uma diversidade que daria uma folha corrida nominá-los uma a um na época do inverno.
Na verdade, tudo ficou na saudade de uma época em que cruzávamos o mato temendo picada de cobra, diferente de hoje que vivemos reclusos dentro de nós mesmos temendo sair de casa, cruzar os matos indo até o sítio jangada ou a carnaubinha no risco de sermos assaltados ou mortos pela mão do mau feitor, do salteador que vive à espreita nas estradas disseminando terror.
É uma pena.

Edilberto Abrantes

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